sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Não Sei Quantas Almas Tenho (Fernando Pessoa)

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não atem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.

1 comentário:

Porcelain disse...

Fernando Pessoa e as suas múltiplas personalidades!! :-D Típico de um nativo de gémeos como ele era!!

Também sinto que transporto dentro de mim um milhão de almas... mas não as sinto como separadas... sinto-as simplesmente como partes de mim, partes de um todo que eu sinto como coeso e coerente... não sinto fragmentação, mas sinto essas almas sim... :-))

Ele tem toda a razão... de tanto ser, só tenho alma... quanto mais buscamos as nossas múltiplas facetas, mais nos aproximamos da nossa alma... (um sábio, verdadeiramente sábio!!)

Incrível, verdadeiramente incrível... estou absolutamente deliciada com os poemas que escolheste para colocar no teu blog!! :-))